Educar a criança, tarefa difícil e de muita responsabilidade. Se as gerações anteriores sofreram com o autoritarismo dos pais e de seus professores a geração que aí está cresce ditando as regras, não é o que acontece em todas as casas, mas existem muitas famílias com essa dificuldade, e é nas escolas onde as dificuldades aparecem. Crianças dominadoras filhas de pais e mães confusos. Poderosas, são intocáveis, respeito pelos mais velhos, obediência as regras sociais, organização e hierarquia são coisas que não valem mais.
Pais e mães que não conseguem delimitar regras e que, quando o fazem, sua tolerância e permissividade é tanta que elas se tornam imperceptíveis ou desmoralizadas, muitas vezes em nome de “meu filho tem muita personalidade”.
E o resultado é esse que se observa: crianças que ditam as regras, difíceis (se não for como querem…), adolescentes rebeldes, depressivos, suicidas, festas onde a bebida é permitida desde muito cedo, com o consentimento dos adultos, a busca do prazer na tontura, no sexo precoce e na falta de censura.
“Se os adultos engatinham por que a criança irá se levantar para caminhar?” (Yves de La Taille)
Se tudo é como a criança deseja como vai educar-se para vencer os conflitos e frustrações inevitáveis da vida? Se tudo lhe é facilitado que desejo terá de aprender e enfrentar seus limites? Que condições terá de enfrentar os desafios da adolescência? E é aí que procura outras saídas, as menos saudáveis e as mais perigosas.
Crescer exige esforço orgânico, boa alimentação, condições de higiene, etc. Desenvolver-se cognitivamente e afetivamente, exige igualmente condições como: curiosidade, desejo de superar limites, respeito pelo diferente.
Existem crianças e jovens com medo de crescer, ancoram-se em determinada etapa não querendo ultrapassá-la pela comodidade e pelo medo do desconhecido. Agarram-se a mamadeira, as manias, ao quarto e cama de seus pais, fogem dos amigos novos, dos novos conhecimentos. Ficam esperando que façam por elas, chamamos de “modelo de aprendência de espera”.
Desenvolver-se é transpor a linha do conhecido, é sair do lugar de conforto.
“Educar é ajudá-lo cognitivamente e emocionalmente a transpor os limites.” (Yves de La Taille)
A boa educação é aquela que puxa o desenvolvimento, que promove curiosidade, o esforço na superação dos obstáculos. Sempre, é claro, atendendo as necessidades de cada faixa etária, respeitando a construção cognitiva de cada um (a infância é preciosa), mas puxando para frente sempre.
Uma criança que pode tudo ou que é privada do conflito dos relacionamentos ou que tem adultos (pais, avós, “babás”, professores), que resolvem (falam, pensam, decidem) tudo por ela não desenvolve uma identidade que lhes permita encarar a vida como de fato ela se apresenta.
Não existem crianças preguiçosas, existem crianças que não recebem estímulo para, ou que, em suas casas ou escola não encontram bons modelos para seguir. Se lá em casa ninguém lê, eu vou ler por quê?
Aprender exige esforço, tempo, paciência e dedicação. Na escola o tempo de aprender é organizado. Em casa é preciso ter local adequado e rotina estabelecida. Não é em qualquer lugar que se faz o tema, nem a qualquer hora, não é em qualquer lugar que se come, nem em qualquer horário, etc.
Criança precisa de organização para aprender a ser organizada. Se os adultos não se dispuserem a ajudá-la organizando o ambiente e o tempo e exigindo-lhes o cumprimento da rotina, não será espontaneamente que a criança o fará. Não se nasce organizado, não se nasce responsável, fica-se porque se aprende com bons modelos, com a exigência e a necessidade.
“O adulto não deve ´engatinhar` é a criança que precisa ´andar`. Mas se todo a sua volta engatinharem, que motivo terá ela para levantar?” (Yves de La Taille)
A criança necessita querer ser excelente naquilo que faz; não ser melhor do que o outro, mas ser melhor do que ela mesma era. Atiçar nas crianças a competição com o outro é ancorá-los ao seu próprio “umbigo”, o “eu melhor do que ele” deve ser substituído pelo eu melhor do o que o eu de ontem; sempre podemos fazer melhor o que sabemos. Até porque é impossível ser melhor do que os outros em tudo. Aprender a perder é imprescindível na infância para que o ego adulto cresça forte superando conflitos e perdas.
Segundo Adler, a tendência natural da criança a se tornar adulta pode ser ajudada ou dificultada pela influência dos adultos e da sociedade.
“As crianças mimadas sentem-se sempre ameaçadas e em país inimigo quando se encontram fora do círculo onde são mimadas .” (Adler ,1938)
O perigo do excesso de mimo está em passar à criança a ideia de que ela merece sempre ser o centro das atenções, que é perfeita. Essa atitude faz com que a criança construa uma autoestima artificial e, quando ela entra em contato com pessoas estranhas ao seu círculo familiar venha a sofrer as consequências deste tipo de excesso de atenção e valorização.
Segundo Yves La Taille “o resultado deste confronto é sempre infeliz: pode traduzir-se numa profunda desestruturação da personalidade ou numa perigosa preservação da autoimagem artificialmente construída por meio da negação dos fracassos e da legitimidade dos juízos alheios, com consequente mergulho numa vida fantasiosa.” (2002)
Uma autoimagem positiva não pode ser construída alienada da realidade e fora do convívio e das relações com a sociedade. Equilíbrio nas relações e estímulo para que a criança possa superar-se e tenta alcançar além dos seus atuais limites é a grande saída. Respeito pelo outro, cumprimento de regras, limites bem estabelecidos, organização na rotina e amor, muito amor, são fundamentais para a educação de mentes sadias e inteligentes. Dar amor é também dizer não! Dar amor é ensinar a viver!
Yves de La Taille (França) – É Professor Titular do Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP). Ministra aulas de Psicologia do Desenvolvimento e desenvolve suas pesquisas na área de Psicologia Moral (desenvolvimento moral).
Alfred Adler (1870 – 1837 – Áutria) – Medico Psiquiatra, Filósofo e Psicólogo, fundador da psicologia do desenvolvimento individual.